sexta-feira, 14 de dezembro de 2012





A FAVOR DAS COTAS NAS UNIVERSIDADES PÚBLICAS PAULISTAS.

Agora de longe, continuo acompanhando as propostas e as manifestações a respeito de um programa de cotas para negros nas universidades públicas paulistas e sinto a necessidade de continuar contribuindo com o debate trazendo à luz as propostas que desenvolvi com a minha equipe na Coordenação de Políticas para a População Negra e Indígena quando lá estávamos até a poucos dias.

Desenvolvemos e apresentamos três propostas de cotas contemplando negros urbanos, indígenas e quilombolas respeitando as peculiaridades que especialmente este último grupo, muito embora formado em quase toda a sua totalidade por negros, tem em relação aos que vivem nas cidades.


Proposta 1

Art. 1º. As universidades e faculdades públicas paulistas reservarão em cada concurso de seleção para ingresso nos cursos de graduação, por curso e por turno, no mínimo, 50% (cinquenta por cento) de suas vagas para estudantes que tenham cursado integralmente o ensino médio de forma presencial na rede pública de ensino e/ou se declararam civilmente negros, assim distribuídas:

§1º – 45% (quarenta e cinco por cento) das vagas serão destinadas a candidatos que cursaram integralmente o ensino médio de forma presencial na rede pública de ensino, doravante denominados cotistas da rede pública.

I – 15% (quinze por cento) desta cota será reservada para candidatos que além de cotistas da rede pública, se declararam civilmente negros, índice correspondente à proporção de pretos e pardos na população do Estado de São Paulo, segundo o último censo da Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE.

§2º - 5% das vagas serão reservadas para os candidatos que se declararam civilmente negros, doravante denominados cotistas negros, independentemente de terem cursado ou não o ensino médio na rede pública.

Art. 2º. No caso de não preenchimento das vagas segundo os critérios estabelecidos no artigo 1º, as remanescentes deverão ser completadas, respectivamente, por candidatos:
§1º – negros cotistas da rede pública;
§ 2º – cotistas negros;
§ 3º– cotistas da rede pública;
§ 4º – demais candidatos.

Programa Especial para Quilombolas e Indígenas

Art. 3º. A fim de garantir a inclusão nas universidades e faculdades públicas paulistas da população indígena e quilombola, o Governo do Estado de São Paulo implantará o ProFis Indígena e Quilombola – Programa de Formação Interdisciplinar Superior.

§ 1º - O ProFis Indígena e Quilombola consiste em um curso interdisciplinar que inclui disciplinas das áreas de ciências humanas, biológicas, exatas e tecnológicas, distribuídas por dois anos de curso, objetivando oferecer aos alunos uma visão integrada do mundo contemporâneo e capacitá-los para exercer as mais distintas profissões.

§ 2º - Concluído o ProFis Indígena e Quilombola e aprovado em avaliação de rendimento, o aluno ingressará, sem vestibular, em um curso de graduação de qualquer universidade ou faculdade pública paulista.

§3º - As vagas nas universidades e faculdades públicas paulistas serão preenchidas tendo por base o coeficiente de rendimento dos alunos nas disciplinas obrigatórias do curso.

§ 4º - O aluno com maior coeficiente de rendimento nas disciplinas obrigatórias escolherá o curso no qual ingressará. Em seguida, o aluno classificado em segundo lugar escolherá uma das vagas restantes. Esse processo será repetido, seguindo a ordem decrescente de coeficiente, até que sejam contemplados todos os alunos que desejarem ingressar em uma das vagas disponíveis.

§ 5º - No primeiro e segundo ano em que o Programa for implantado haverá a disponibilização de no mínimo 13 (treze) vagas para indígenas, sendo um de cada terra indígena e 52 (cinquenta e duas) para quilombolas, sendo um de cada quilombo reconhecido ou indicado para reconhecimento no Estado de São Paulo, que tenham cursado o ensino médio em escolas da rede pública de ensino.

§ 6º - A partir do terceiro ano dever-se-á dobrar o número de vagas para ingresso no Programa, respeitando-se a cota reservada a indígenas e quilombolas.

§ 7º - As vagas serão preenchidas pelos candidatos que forem indicados pela Coordenação de Políticas para População Negra e Indígena da Secretaria da Justiça e da Defesa da Cidadania que realizará o procedimento de escolha considerando a manifestação de vontade das lideranças indígenas e quilombolas.

Disposições Finais

Art. 4º. A Coordenação de Políticas para População Negra e Indígena da Secretaria da Justiça da Defesa e da Cidadania caberá o acompanhamento e avaliação deste programa de inclusão.

Art. 5º. O Governo do Estado de São Paulo promoverá no prazo de 5(cinco) anos, a contar da publicação desta lei, a revisão do programa especial para o acesso nas instituições de educação superior de estudantes negros, quilombolas, indígenas e oriundos da rede publica de ensino.

A INCLUSÃO DOS NEGROS E NEGRAS DA REDE PARTICULAR.

Como se pode observar, uma importante diferença de todas as propostas em discussão e mesmo em relação às leis já aprovadas e programas instituídos é que incluímos a possibilidade de até 5% (cinco) por cento dos negros inseridos nesse processo de ação afirmativa serem oriundos ou terem passado pela rede particular de ensino e o fizemos por justificadas razões.

A primeira delas é incluir negros que tenham sido bolsistas na rede particular.

A segunda razão, que é absolutamente verdadeira, é que nem todas as escolas particulares são de excelência, ao contrário, boa parte delas ou mesmo a maior parte delas é tão ruim quanto as da rede pública, todavia, especialmente em se tratando de pessoas humildes levadas a equívocos pela pressão social a que somos submetidos, famílias fazem enormes sacrifícios, muitas vezes até mesmo deixando outros membros da casa sem estudar e se cotizam para “investir” naquele(a) que acreditam ser mais inteligente e o fazem, como disse acima, em escolas de qualidade no mínimo duvidosa.

A terceira razão é que quem estudou, ainda que só um mês na escola particular, pelas regras estabelecidas, perdeu a oportunidade de se beneficiar das cotas o que nos leva, no mínimo, a um quarto motivo.

Independentemente de ter estudado na rede particular, o vestibulando ou vestibulanda não perderá a sua condição de negro, de vítima histórica do racismo e todo o peso depositado sobre os seus ombros e sabemos o que isto representa e quanto isto faz diferença na hora do vestibular.

PREPARAÇÃO PRÉVIA SÓ PARA INDÍGENAS ALDEADOS E QUILOMBOLAS.

Devido as suas peculiaridades culturais e tomando por base o rendimento das escolas públicas das aldeias e quilombos, apresentamos a proposta de um PROFIS apenas para alunos dessas comunidades e confesso que aqui foi onde tivemos mais dúvidas da melhor forma de fazê-lo.

Pois bem, ela aí está para o debate público que sempre amplia as possibilidades de aperfeiçoamento.

CIVILMENTE NEGROS.

Outra importante questão que aparece nas nossas três propostas com destaque é a expressão “se declaram civilmente negros” para evitar oportunismos, ou seja, quem se inscrever no vestibular e se declarar negro, o será para o resto da vida porque essa manifestação deverá ser levada a todos os seus registros de identificação pública para que, se for o caso, dessa ocasião em diante seja ele assim reconhecido.

POR CURSO E POR TURNO
Entendemos ser importante deixar expresso que as cotas nos percentuais estabelecidos são por “curso e por turno” para que se deixe de apresentar estatísticas com números globais que encobrem a desigualdade ainda maior nos cursos tidos como de excelência.

Proposta 2

Art. 1º. As universidades e faculdades públicas paulistas reservarão, em cada concurso de seleção para ingresso nos cursos de graduação, por curso e por turno, no mínimo, 50% (cinquenta por cento) de suas vagas para estudantes que tenham cursado integralmente o ensino médio de forma presencial na rede pública de ensino e/ou se declararam civilmente negros, assim distribuídas:

§1º 32,5% (trinta e dois e meio por cento) das vagas serão destinadas a candidatos que cursaram integralmente o ensino médio de forma presencial na rede pública de ensino, doravante denominados cotistas da rede pública.

§2º 17,5% (dezessete e meio por cento) das vagas serão reservados para candidatos que além de cotistas da rede pública, se declararam civilmente negros, índice correspondente à proporção de pretos e pardos na população do Estado de São Paulo, segundo o último censo da Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE.


Art. 2º - Todos os candidatos civilmente declarados negros e que optarem pela pontuação acrescida terão uma majoração em sua nota correspondente a 20% (vinte por cento) do desvio padrão da nota da prova, sendo esse desvio padrão calculado separadamente no universo de cotistas e não cotistas, entre os candidatos presentes.

Art.3º. No caso de não preenchimento das vagas segundo os critérios estabelecidos no artigo 1º, as remanescentes deverão ser completadas, respectivamente, por candidatos:
§1º – negros cotistas da rede pública;
§2º– cotistas da rede pública;
§3º – demais candidatos.

Nessa segunda proposta mesclamos o sistema de cotas conhecido com o de pontuação acrescida, que tem apresentado excelentes resultados nas escolas públicas do Centro Paula Souza – ETECs e FATECs alcançando índices de inclusão de negros de 36% para os cursos técnicos e acima de 24% para a faculdade de tecnologia.

Sempre insisti nisso e não entendo porque o governo não divulga esses resultados. Daí talvez também algumas interpretações equivocadas sobre a minha posição sobre o assunto.

Proposta 3

Art. 1º. As universidades e faculdades públicas paulistas reservarão, em cada concurso de seleção para ingresso nos cursos de graduação, por curso e por turno, no mínimo, 50% (cinquenta por cento) de suas vagas para estudantes que tenham cursado integralmente o ensino médio de forma presencial na rede pública.

Art. 2º - Todos os candidatos civilmente declarados negros e que optarem pela pontuação acrescida terão uma majoração em sua nota correspondente a 20% do desvio padrão da nota da prova, sendo esse desvio padrão calculado separadamente no universo de cotistas e não cotistas, entre os candidatos presentes.

Art.3º.  No caso de não preenchimento das vagas segundo os critérios estabelecidos no artigo 1º, as remanescentes deverão ser completadas, respectivam3ente, por candidatos
§1º – que se declararam civilmente negros
§ 2º – demais candidatos

Nesta terceira proposta trabalhamos com outra possibilidade de cota mais a pontuação acrescida. É mais simples, porém, igualmente inclusiva.

O DEBATE

Por minha história no Movimento Negro eu não poderia ser contrário as cotas tanto que quando solicitado a elaborar sugestões pela função que ocupava, as apresentei, fruto de trabalho feito com a minha equipe e ouvindo especialistas.

Como ainda não foram compartilhadas faço-o no meu espaço para ouvir críticas, sugestões, mas, o que é mais importante, para colaborar com o debate para que as cotas sejam implantadas imediatamente. Nada justifica que as universidades paulistas criem dificuldades para a sua pronta adoção.

Esse debate iniciou-se em 1995 quando celebramos o Tricentenário da Imortalidade de Zumbi dos Palmares quando na USP criou-se uma comissão para fazer estudos e sugestões de ações afirmativas e o trabalho foi apresentado, portanto, não é novo e a decisão do STF criou contornos definitivos para as cotas nas universidades públicas de todo o Brasil. É o que se impõe!