sexta-feira, 6 de junho de 2014





JOAQUIM BARBOSA

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 Altivez e Independência.


Foi com grande satisfação e orgulho que recebi a notícia de que o Ministro Joaquim Barbosa, Presidente do Supremo Tribunal Federal decidiu aposentar-se ao final do mês de junho restando ainda alguns meses para o final regulamentar da sua gestão à frente de um dos três poderes da Nação.
Os oportunistas de sempre não perdem a chance de tentar, mais uma vez, desqualificá-lo e três razões se sobressaem para tal aventura:
(1) é negro (retinto perto dos outros dois ministros negros que antes dele também chegaram a Alta Corte do Brasil Pedro Lessa e Hermenegildo Rodrigues de Barros);
(2) possui cultura e formação superior muito maior que qualquer um dos seus críticos, posso apostar e;
(3) fez um trabalho brilhante como relator do mais difícil julgamento da história da Suprema Corte mostrando que não tinha subalternidade aos detentores do poder que o haviam indicado – é isso mesmo só o indicaram e o fizeram em razão do seu brilhantismo profissional e formação acadêmica impecável – todavia, não tinham idéia da sua independência, dignidade e austeridade.
Muitos são os revoltados com o resultado do julgamento do Mensalão (Ação Penal 470) e propositadamente distorcem os fatos.
O Ministro Joaquim Barbosa foi o relator e apresentou os fatos e o direito a ser aplicado ao caso. Seus colegas é que de forma colegiada com ampla e larga votação CONDENARAM os criminosos que estavam envolvidos no processo como réus em denúncia feita pelo Ministério Público (Promotor) que era o titular da ação.
Não foi o Ministro Joaquim Barbosa o investigador e o acusador dos crimes. Ele foi o relator do processo que em plenário poderia ter seu relatório derrotado, mas não, o que apresentou levou ao entendimento da maioria dos outros ministros do STF de que estavam diante de crimes e os seus autores, todos conhecidos e identificados deveriam ser condenados.
É assim que funciona um tribunal em qualquer país democrático do mundo.
A maior revolta dos críticos (na verdade censores) de Joaquim Barbosa é a condenação e a prisão de José Dirceu sob o ingênuo argumento de que ele não mentiu e não é culpado. Parece o famoso comercial de tevê como engraçado jargão: Sabe de nada inocente.
Não se pode admitir tanta ingenuidade.
Ainda que o Zé Dirceu tivesse tido outra trajetória em algumas atitudes na sua vida, já não seria suficiente para torná-lo automaticamente numa pessoa acima de qualquer suspeita. Todavia, como cometeu outros graves deslizes éticos é incompreensível tanta paixão, não em sua defesa, mas nos virulentos ataques ao Ministro Joaquim Barbosa pelo julgamento.
Vamos deixar claro que não estou falando do ativista político estudantil de grande importância no enfrentamento da ditadura militar e que continuaria por essas ações, a merecer todo o nosso respeito e homenagens, mas, errou, foi julgado, condenado e está cumprindo a pena.
Causa-me estranhamento também as duras críticas feitas ao Ministro Joaquim Barbosa pela contundência das penas e a forma da sua execução aos condenados do mensalão.
Não vejo essas críticas, salvo honrosas e raríssimas exceções, em relação aos jovens negros que abarrotam as masmorras brasileiras que recebem penas altíssimas, duríssimas, por pequenos delitos e muitas vezes, por crimes que sequer cometeram.
A nossa juventude que em grande maioria vive em situação de vulnerabilidade é morta principalmente pelas polícias militares ou são, em grande número de vezes, injustamente presos, julgados com todo o rigor da lei.
Os tribunais, a quem cabe interpretar e aplicar as leis, em relação a nós negros sempre o fazem com exagerado rigor e o encarceramento muitas vezes, se dá sem nenhum tipo de benefício de progressão contrariando o que estabelece a legislação.
Quem como eu vive a experiência de advogar na defesa de jovens negros, sabe ao que estou me referindo e o resultado é visível com milhares de negros (as) nas prisões, sobretudo jovens.
Mas para os brancos poderosos do mensalão a rudeza da prisão é insuportável, ainda mais patrocinada por um homem negro.
O que fizeram então?
Aproveitando a obrigatória mudança saída por aposentadoria compulsória de outros ministros do STF, alteraram a composição de forças lá colocando gente mais cordata, afinada com o que pensa o Planalto.
O Ministro Joaquim Barbosa seria de ora em diante um Judas a ser malhado publicamente a cada oportunidade. A revisão de parte do julgamento do mensalão recentemente ocorrida foi a primeira mostra ao que vieram os novos ministros que se juntaram aos que eram minoritários nessa linha de atuação.
O Ministro Joaquim Barbosa, mais uma vez demonstrando coerência, altivez e independência retira-se do Supremo Tribunal Federal, como seu presidente, para colocar em NEGRITO o seu nome na história.

quinta-feira, 15 de maio de 2014




30 ANOS DO CONSELHO DA COMUNIDADE NEGRA.
MISSÃO CUMPRIDA!

Neste artigo abordarei uma questão delicada e o farei com a autoridade de quem integrou o triunvirato que foi nomeado pelo governador para criá-lo, partícipe da sua primeira diretoria executiva e seu presidente por oito anos e um estudioso sobre o assunto.

O Conselho de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra do Estado de São Paulo completou neste 13 de maio, trinta anos da sua instalação. Criado na gestão Franco Montoro, nasceu no período em que se esboçava a redemocratização do Brasil e não foi um mero espectador foi nacionalmente ator importante na inserção da questão racial negra como de fundamental importância na volta da plenitude democrática.

É de se destacar a sua participação na Comissão Provisória de Estudos Constitucionais que foi a base da atual Constituição Brasileira, reconhecida como uma das melhores do Mundo e que traz artigos específicos sobre o enfrentamento do racismo e da necessidade do Estado Brasileiro garantir as propriedades territoriais quilombolas e reconhecer a importância da população negra na cultura e a sua contribuição na formação do Brasil.

Integraram o Conselho da Comunidade Negra de São Paulo pessoas de destaque político, intelectual, social, sindicalistas e podemos citar alguns, como Helio Santos – seu primeiro presidente – Ivair Augusto, Benedito Cintra, Coronel Vitória, a Delegada Maria Clementina, Prof. Eduardo de Oliveira, Sueli Carneiro, Maria Aparecida de Laia, o reitor José Vicente, Juarez Xavier, Ubiraci Dantas (Bira), Oscarlino Marçal, Oswaldo Ribeiro, o então jogador Wladimir, o rapper Xis. O risco de se fazer uma lista como essa é de omitir personalidades importantes, porém, os citados dão, exemplificativamente, a dimensão política do que já foi este órgão colegiado.

O Conselho também foi o órgão formador de diversas lideranças e acadêmicos que lá trabalharam, os professores doutores Hédio Silva, os irmãos Rosângela e Antonio Carlos Billy Malachias, Cida Bento, criou espaços para artistas como Maurício Pestana, A 4 Vozes, Quinteto em Branco e Preto.

Desde a sua formação é necessário destacar que além do Estado de São Paulo com sua atuação, o Conselho da Comunidade Negra atuou e fez avançar políticas públicas que influenciaram em todos os demais estados da federação e da própria União, na educação, saúde, segurança pública, demarcação, reconhecimento e titulação de áreas quilombolas, cultura, economia.

A criação de órgãos congêneres, de ONGs especializadas, de cursos acadêmicos, da articulação de empreendedores tudo teve como fonte de inspiração o Conselho. A organização de advogados (as) negros que hoje se espalham pelas seções da Ordem dos Advogados de todo o Brasil começou no Conselho da Comunidade Negra.

Todas as políticas públicas sobre a questão racial adotadas no País até o início dos anos 2000 tiveram a participação direta ou a influência do Conselho da Comunidade Negra.

Os avanços propiciados pelo Conselho de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra do Estado de São Paulo, fundamentais inclusive para a democracia brasileira que aos poucos vai se firmando, levaram, todavia, ao seu esgotamento.

O Conselho da Comunidade Negra, não só ele é bom ressaltar, assim como todos os demais outros Conselhos de Cidadania como são chamados os conselhos da Condição Feminina – também com 30 anos – do Idoso, da Criança e do Adolescente, da Pessoa Deficiente perderam a sua finalidade e na forma como existem é impossível serem recriados. Devem ser simplesmente extintos.

Não me alongarei muito nas justificativas para a minha proposta porque tenho certeza que as contestações virão e teremos como aprofundar o debate que certamente se afigurará rico. Apenas para mostrar na prática o que digo, pergunto: qual foi a proposta de política pública apresentada na celebração das suas Bodas de Pérolas?

Qual o fato relevante apresentado, a não ser, é lógico a justa e bonita homenagem ao nosso querido Oswaldo Faustino?

Nada!

Não é de se aborrecer, isto aconteceria porque uma das conquistas da qual o Conselho da Comunidade Negra de São Paulo teve ao longo da sua história papel relevante foi a das liberdades democráticas que possibilitam a qualquer pessoa individualmente, associativamente ou comunitariamente buscar os seus objetivos e exigir os seus direitos.

O surgimento de órgãos executivos como a Secretaria Especial de Promoção da Igualdade Racial do Município de São Paulo e até mesmo a Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial com nível hierárquico de Ministério mostram a caducidade do Conselho de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra do Estado de São Paulo que já cumpriu a sua missão.

sábado, 5 de abril de 2014






Ora senhor governador, faça-me um favor!


A publicação da pesquisa da UFSCAR sobre o percentual de  negros mortos pela Polícia Militar do Estado de São Paulo colocou em destaque, mais uma vez, essa sensível e relevante demanda – ao menos para nós da comunidade negra – quanto à vulnerabilidade de homens negros, de maneira especial da nossa juventude e a falta de ação política para coibir essa violação de direitos humanos em São Paulo.

A matéria publicada sobre a pesquisa me trouxe duas questões importantes que coloco neste meu espaço de reflexão e debate, a saber:
(1) a confirmação, reiterada, de que a violência da Polícia Militar de São Paulo atinge mais os jovens negros em percentual incompatível com a nossa proporção na população e que levou os pesquisadores a concluir, também sem nenhuma novidade e com indesmentível caráter científico, que se trata de racismo institucional;
(2) a matéria trouxe também frase atribuída ao Governador do Estado que alega “desconhecer qualquer tipo de atitude discriminatória nas ações efetuadas pela polícia paulista.” que se for verdadeira é para mim inaceitável.

Há trinta anos quando o Governador Franco Montoro – referência de companheirismo e democrata convicto – criou o Conselho de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra, salvo engano antes mesmo da posse, pela primeira vez, juntamente com os companheiros Helio Santos e Ivair dos Santos, estive no CAES da Polícia Militar onde fizemos uma palestra, seguido de um debate com jovens oficiais da corporação, abordando o racismo da Polícia Militar.

Muitos desses oficiais chegaram a importantes postos de comando e dessa turma fazia parte a ainda tenente Vitória Brasília (negra), que chegou ao posto máximo da carreira como Coronel e comandou durante longo tempo o policiamento escolar de São Paulo.

Desde então, sem interrupção, eu e muitos outros militantes do Movimento Negro – e nessa via aberta por nós adentraram também outros segmentos étnicos e ativistas dos Direitos Humanos – não só com o tema do racismo em relação ao tratamento dispensado a negros e negras pela PM, mas, também de outras discriminações correlatas, assuntos que passaram a integrar a grade de ações curriculares na formação de profissionais de segurança pública da Polícia Militar de São Paulo.

Integrante do SOS-RACISMO do Geledés Instituto da Mulher Negra igualmente participamos de diversos encontros, debates, algumas vezes tensos e duros com comandos da milícia paulista, de forma que não houve desde 1984, solução de continuidade nessa ação política e educacional.

A questão da população negra e do racismo na formação de oficiais capitães da Polícia Militar, no CAO – Curso de Aperfeiçoamento de Oficiais foi por mim tratada durante alguns anos regularmente como professor de Direito Constitucional, com orientação da Coordenação do Curso de fazer abordagem direta sobre o assunto, sem qualquer ressalva ou censura. Nesse período eu exercia a Presidência do Conselho Estadual da Comunidade Negra.

Sempre atuando junto aos Comandantes da Corporação e nunca deixando de apresentar e questionar ações de violência colaborei no convencimento da necessidade, na criação e instalação de uma cadeira que tratasse especificamente do racismo e das novas formas de enfrentamento da discriminação e incluiu-se na formação de todos os membros da Polícia Militar Paulista – inclusive nos cursos de reciclagem - a matéria Igualdade Racial e Ações Afirmativas.

Isso comprova não só a admissão por parte da corporação de que o problema existe como demonstra que, ao menos naquele momento, os oficiais que estavam à frente da PM eram suficientemente abertos para encarar essa realidade.

Ao longo desse tempo, SEMPRE e em diversos formatos e momentos, levamos aos detentores do Poder Público Paulista um quadro sobre a gravidade da situação que é persistente. Diversas organizações dos diferentes movimentos sociais também sempre denunciaram a violência policial em face da população negra, especialmente os jovens. 

A pesquisa científica da UFSCar dá contornos precisos de que o problema persiste.



Outro trabalho científico relevante desenvolvido na UFSCar sobre o racismo institucional da Polícia Militar de São Paulo, foi o apresentado pelo Tenente Coronel Airton Edno Ribeiro, um dos mais brilhantes oficiais da corporação e ex Comandante do CAES, portanto, um alto oficial integrante da PM Paulista e que também pode ser acessado através do link:
 http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/PesquisaObraForm.do?select_action=&co_autor=91377

O gestor público, aquele que atua na área de políticas públicas, deve saber que a única forma de mitigar uma dificuldade é circunscrevê-la, dimensioná-la e o trabalho apresentado pelo Gevac (Grupo de Estudos sobre Violência e Administração de Conflitos) traz essa qualidade para o administrador público que é comprometido com a sua população.

Cabe aqui uma lembrança de Mário Covas, outro grande governador paulista e democrata por convicção, que ensinou que diante da adversidade só há três atitudes possíveis: Enfrentar! Combater! e Vencer!

Nenhum administrador público em São Paulo pode alegar o desconhecimento dessa grave realidade que ceifa a vida de homens negros, notadamente jovens, com tantos trabalhos e informações que temos desenvolvido e apresentado aos setores competentes do governo estadual ao longo de pelo menos três décadas.

Ora senhor governador faça-me um favor!

A falta de companheirismo na política vá lá, mas a falta de respeito com o nosso trabalho e a nossa história não posso aceitar.